Do que eles tanto reclamam?

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Não é uma pergunta retórica. Eu, de fato, queria saber. Às vezes perco hora de sono pensando “o que que foi? Por que eu tento tanto, dou tanto amor, e tenho que ouvir tanto nhenhenhem…? Por que um menino fofura que nem esse pequetito resmunga tanto, ao primeiro sinal de adversidade?" É assim: se eu deixar correr no ritmo dele, é só amor! Se eu parar o mundo pra dar o lanchinho na hora exata que ele pede, se eu deixar ele escolher o copo, escolher o suco, escolher o pão e, especialmente, escolher a hora de parar de comer o que eu preparei pra se deixar distrair por outra coisa, fica tudo na paz. Se eu sentar do lado dele pra brincar com o que ele quer, e se eu disser "siiiim, meu amor", quando ele pede pra jogar no tablet, se eu não exigir que ele escove os dentes, ou tire o pijama, ou coloque o chinelo, é uma coisinha deliciosa!

Tem quem ache que é exatamente porque tento demais. Pode ser. É. Deve ser. Eu ouvi outro dia uma palestra de uma pediatra e, no meio de um monte de coisas boas que ela disse, eu gravei: "não tenham medo dos seus filhos". Eu, em minha defesa, digo que não é exatamente deles que eu tenho medo, e que tenho bem resolvidas algumas questões, como o fato de que cabe a mim dizer "não" e que eles não vão me amar menos por isso. A longo prazo, pode ser que amem mais, eu sei. Mas numa rotina estressante de cuidados da casa, das crianças, de mim mesma e de mais uma galerinha que faz parte da minha vida, pode ser que eu tenha medo da confusão, do chororô, daquela ladainha no meu ouvido, e pode ser que eu, sem querer, dê espaço pra essa reclamação toda. Eu sei, já experimentei, até existem formas de evitar o resmungo diante dos limites que a vida vai trazendo, mas é preciso tanto tempo, tantas palavras, tantos agachamentos, tanta calma… tudo numa proporção bastante irreal, eu diria.

Meus filhos não são os únicos que querem tudo na mão, na hora, sem demora, não é? Acho até que esse é um instinto humano bem normal, e a questão é que a gente vem alimentando isso de forma perigosa ao longo dos anos. Eles costumam esperar o quê? Quase nada. Querem colorir o desenho de um personagem novo? Eu imprimo! Querem ver um filme? Não precisa esperar passar na TV, tem na Netflix, ou no Youtube, ou a gente acha por aí! No caso dos meus, especialmente, tem um agravante: quase todo o tempo que eles estão em casa, eu estou também, então, embora eu tenha outros interesses e obrigações, isso significa, pra eles, que eles têm mamãe aqui, "olha ali a mamãe que vive pra cuidar de mim", "olha ali a mamãe querendo acertar e me dar amor". Eles sabem o que fazem…

Na semana passada, num dos dias de resmungos nível máximo, eu perguntei pro menino, cujos seis anos me fazem achar que já podemos aprofundar algumas questões: "você já reparou que você reclama de tudo?" Ele deu de ombros. Estávamos no banheiro, ele muito infeliz porque tinha que tomar banho num chuveiro confortável e vestir uma roupa limpinha e cheirosa. "Já percebeu que se eu passar o condicionador na sua cabeça você reclama que é chato e que se eu não passar você reclama que o cabelo fica embaraçado? O que você acha que eu devo fazer?" Ele me olhou em silêncio, enxaguou a cabeça e depois disse: "desculpa, mãe". E não reclamou mais naquele dia. Eram 21h17.