A novidade, as alegrias (e o quanto dói)

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Imagine uma boa notícia… você vai viajar, ou vai trocar de carro, ou, sei lá, vai ganhar um quarto novo... É isso! Você vai ganhar um quarto novo! Sábado levantamos cedo para preparar o ambiente, desocupar prateleiras, arrancar os quadros antigos e improvisados da parede, colocar as roupas em malas e os brinquedos em uma caixa - onde vão ficar por uma semana ou duas, à espera do armário novo, que foi projetado especialmente pra eles, e que combina com a cama nova, muito caprichada, muito irada, pra usar a palavra do momento. O menino levantou disposto, sorriu quando eu disse que era pra se despedir da cama, "essa é a penúltima noite que você dorme nela", e avisou que ia tirar os sapatos todos da gaveta, "deixa, mãe, eu coloco num saco".

Antes disso fomos pra cozinha, "vem tomar café, que o papai já vai começar a desmontar o armário", e ele sentou, esperou, tomou leite, mas de repente parou. Pôs a mão na garganta, fez careta, disse que estava enjoado, "quer ir ao banheiro?", "não, mãe, não é isso. Não sei o que é, é uma coisa na garganta", e eu imaginei que pudesse ser alguma coisa mal digerida, um vírus do momento, mas também podia ser outra coisa. O pai deu um limão pra cheirar, vamos ganhar tempo, "respira fundo", e quando eu sentei do lado dele e fiz um carinho na cabeça, ele me olhou com os olhos molhados e disse: "eu vou sentir muitas saudades da minha caminha".

A caminha é a mais simples possível, semelhante à oferta mais barata que você achar aí no Google. Nem madeira direito aquilo deve ser. Compramos assim na época porque o pequetito estava chegando, precisávamos preparar o quarto, e não era hora de investir mais, precisava ficar pra depois. Foi nessa caminha barata que ele se sentiu "grande", na responsabilidade de receber o irmão, o novo dono do bercinho. Foi dali que ele ficou me observando amamentar o bebê e ali que ele precisou aprender a dormir sozinho, porque o neném precisa de colo e "mamãe não pode mais deitar do seu lado, mas vai ficar te olhando daqui". Era nessa caminha de colchão meio mole que ele ficava de preguiça de manhã, dizendo que não queria ir na natação ou que tinha sonhado que o Lord Garmadon estava aqui em casa. E, recentemente, foi ali que ele descobriu que não precisa mais de mim pra ler histórias antes de dormir. Ele lê sozinho.

Pra todas essas coisas - e pra mais um monte de outras - o preço, o design, o borogodó da cama não fazem a menor diferença. A saudade aperta porque era uma cama de afeto, de calor humano, de carinho no rosto e beijo na bochecha. Aí eu conto essa história, e alguém me diz: "nossa, então quer dizer ele não quer o quarto novo?" Não! Ele quer! É claro que ele quer! Ele sabe que a cama nova vai trazer mais uma imensa dose de aprendizados, sabe que novos sonhos virão e sorri animado quando a gente fala da mesa de estudos, da cor nova da parede e da luminária que vai ficar ao alcance das suas mãos. O que isso quer dizer é que a tristeza, às vezes, cabe na alegria, e que tudo bem. É assim. Crescer é assim. A gente acorda sorrindo, aí vem um nó na garganta, a gente respira fundo, bem fundo, e depois sorri de novo. É hora de estrear a cama nova.

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