De quanto ele precisa?

Estávamos no parquinho, entretidos com areia e baldinho, quando chegou uma mulher com um menino de 3 ou 4 anos. Junto com eles, veio uma sacola enorme, do tipo dessas ecológicas de supermercado, que a mulher colocou no chão, perto do menino. Ela sentou para ler uma revista, e ele não pensou muito: virou a sacola de ponta cabeça, e eu vi cair dezenas de bonecos. Umas 30, talvez 40 réplicas, daquelas de 30cm, de todos os super-heróis, vilões, robôs, guerreiros e não sei mais o quê que você possa imaginar. Eu juro: mais parecia um mostruário pra revenda de brinquedos... Mas quatro ou cinco minutos foi o tempo que o menino se ocupou de brincar com eles. Pegou um daqui, um dali, jogou pro alto, sujou de areia, e em pouquíssimo tempo começou a andar de um lado para o outro, sem interesse nem nos bonecos, nem no escorregador, muito menos em construir um castelo de areia. 

A teoria de que estímulo - e oferta - em excesso mais atormenta do que ajuda não é novidade, e pode ser comprovada em qualquer canto, basta observar uma criança. O volume de opçōes, guardadas as devidas exceções, costuma ser inversamente proporcional ao sucesso de determinada brincadeira. É o que dizem os estudiosos, e é o que eu vejo, sem estudo nenhum, no dia a dia. Claro que é difícil, porque, se tudo anda caro demais, paradoxalmente vivemos uma época em que as coisas estão muito mais acessíveis, e tem hora que é preciso se esforçar para não lotar a casa de brindes, brinquedos e equivalentes… Afinal, de quantas caixas, caixinhas e caixões de lápis de cor precisamos, meu Deus?! 

Eu me lembro da rica sensação de querer (e continuar querendo, por algum tempo) uma determinada boneca, ou aquela caixa que trazia 36 cores de lápis de cor. Prestes a completar 4 anos, meu filho fez outro dia, espontaneamente, uma lista com os presentes que quer ganhar de aniversário até quando somar 7 anos. Um transformer este ano, um vingador ano que vem, uma fantasia de astronauta e uma fábrica de cabelos de massinha, que dá pra cortar e cortar e cortar… Eu podia o ter chamado pra realidade e explicado que ele pode, perfeitamente, negociar isso tudo com as tias e avós e liquidar essa conta ainda em 2015, mas não quis estragar a festa.

O que interessa, na verdade, não é quantos presentes uma criança ganha no aniversário, nem se você dá brinquedos novos toda semana. A questão, aqui, é pensar sobre que tipo de oportunidade estamos oferecendo aos nossos filhos. Uma sacola lotada de bonecos do momento parece uma boa fonte de diversão, mas a oportunidade mais valiosa me parece estar longe dali. Qualquer criança teria o ímpeto de revirar uma sacola cheia de brinquedos, é claro, mas nos cabe mostrar a ela que dois ou três bonecos preferidos, companhia e paz podem render histórias infinitas. Nos cabe incentivá-la a explorar pouco a pouco o mundo de possibilidades que temos aí, e não lhe oferecer o mundo inteiro dentro de uma sacola. 

Uma conhecida me disse uma vez que a filha dela, “engraçado, não tem imaginação”. Fico carinhosamente torcendo para que ela esteja enganada. Ou isso ou, em pouco mais de cinco anos, a vida já tirou da menina um dos seus mais preciosos tesouros.

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