Seis anos, uma janela

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Quem me contou que o dente caiu foi a professora dele. Nos encontramos na porta da escola, ela de saída e eu indo pegar meus meninos, e ela disse “caiu, foi tranquilo... na hora do lanche... um biscoito... ele ficou feliz”. Eu posso imaginar o quanto ficou feliz, pensei comigo, lembrando de cada vez em que, ao longo das últimas semanas, ele mexia no dente, sorria, me pedia pra ver “se está mais mole, se já vai cair”. Caiu um dente e só. É  coisa simples, acontece com todo mundo, muito mais que uma vez, inclusive, mas eu sabia o que aquilo - o primeiro dente perdido - significava pra ele.

Estou quase sempre numa batalha interna para curtir a vida sem pressa, sem pânico, sem querer que o tempo ande mais devagar, ou mais depressa... É só olhar pro lado e vejo gente que, sem se dar conta, passa a vida se lamentando do rumo das coisas, da velocidade dos fatos, do jeito que as coisas são, do quanto isso podia ser assim ou aquilo podia ficar assado… E ele sorri banguela. Está pronto pro que está chegando, gosta do cabelo que tem, do rosto que tem, do dente, da janelinha, gosta de fazer aniversário! Esta semana ele completa seis anos de idade e sabe como ele me disse que queria estar? Banguela, indo pra escola, brincando com o irmão, fazendo seis anos de idade.

Em algum momento a criança que nós fomos rompe com o tempo, fica (muitas vezes) chateada com o corpo que tem, com o jeito que é, com o que está em volta, e eu sei que muito provavelmente isso vai acontecer também com ele. Faz parte da vida, diriam alguns. Eu só espero que lá pra frente, depois de vencidas as crises necessárias (que hão de ser brandas), ele possa recuperar essa disposição pra ser quem ele é, possa festejar a passagem do tempo com a mesma cara feliz que ele promete fazer essa semana, possa achar bonitas as mudanças que vão chegando e possa entender que é tudo dele, no tempo dele.

Quando terminei de subir a rampa da escola e nos encontramos na porta da sala, ele sorriu de leve e disse: “sabe o que aconteceu?” Eu sinalizei que sim, “a sua professora me contou”, ele correu pros meus braços, me abraçou, começou a contar que estava na quadra, bateu um dente no outro, depois foi pro lanche, mordeu o biscoito, tirou aquilo da boca, pediu ajuda, “o que é isso?”, “seu dente!”, e que sorte, nem saiu sangue, “nem doeu, mãe!”, e agora ele está prontinho. Uma longa história contada em 30 segundos, muitas palavras, mãos e pés balançando, coração aos pulos. “Estou feliz, mãe, porque estou crescendo mesmo”. Exatamente como deve ser.

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